segunda-feira, janeiro 14, 2008

Despenalização do fumo e do aborto - 2028

Despenalização do fumo e do aborto


O Presidente da República Portuguesa convocou hoje o referendo à despenalização do fumo em locais públicos, depois de o Tribunal Constitucional se ter pronunciado favoravelmente à pergunta: "Concorda com a despenalização do fumo em locais públicos, se realizado por opção do fumador maior de idade ou emancipado?".

Desde 2008, conhecem-se 130 processos terminados, com 344 arguidos (todos de baixos rendimentos) e 103 condenações. Segundo a análise feita pelos deputados que requereram o referendo, a maioria dos fumadores julgados tinha entre 35 e 50 anos e fumava por prazer

Conhece-se agora o primeiro movimento a favor da despenalização, "Sim Fumamos!"

No documento constitutivo do movimento, que reúne fumadores de vários quadrantes políticos, partidários e culturais lê-se: "Os julgamentos de Lisboa, Coimbra e Braga são exemplos da ineficácia da actual Lei – não evita que se fume e coloca os fumadores numa posição desumana de penalização e humilhação.

Aquando da elaboração da lei o governo de Sócrates afirmou ter em conta sobretudo a prevenção do tabagismo, proibindo-o, protegendo assim a sociedade, principalmente os cidadãos mais vulneráveis.

"É vergonhosa a condição a que nós, fumadores, somos remetidos. Empurram-nos para a barra do tribunal, abrindo espaço a que se criem espaços privados de higiene e condições. Somos actualmente vítimas do fumo do vão de escada e sentimo-nos verdadeiros criminosos. No entanto aqueles que tem posses conseguem fumar sem ser importunados"

Enquanto a actual Lei se mantiver, acontecerão as denúncias e como consequência a investigação policial sobre fumadores e suas famílias. O tabagismo clandestino é um flagelo e um problema de saúde pública A actual política de proibição impede o SNS de ajudar os fumadores, prevenindo os seus riscos através da educação para a saúde.

Talvez não cheguemos a ler esta notícia no ano de 2028. É, claro está, uma analogia aparentemente exagerada e desproporcionada entre o aborto e a caça aos fumadores.

Mas a verdade é que vivemos numa sociedade onde o aborto não é penalizado em nome da liberdade individual; ao mesmo tempo, vemos nos primeiros dias de Janeiro notícias como "Três homens apanhados a fumar pela Polícia".

Que modelo de sociedade estamos a construir e, sobretudo, o que significa para nós a liberdade? Somos actualmente a sociedade do "sanitariamente correcto", mesmo que não se olhe a medidas despropositadas para impor ao indivíduo o que ele pode ou não fazer. O critério da razoabilidade e da intervenção mínima do Estado nas liberdades individuais é preterido em função do padrão uniformizador dos hábitos e das consciências.

Está patente aos olhos de todos que o tabagismo é um problema actual e efectivo. O ataque às causas, a prevenção e, sobretudo, a sua proibição são medidas indiscutivelmente eficazes na luta contra uma das maiores causas de mortalidade a nível mundial.

Porém, o mesmo raciocínio não serve já interesses tão ou mais fundamentais como o valor da vida em si, o valor da vida dos outros. Enquanto o governo proíbe o cigarro, permite e paga o aborto. Por absurdo uma grávida com menos de 10 semanas pode ser punida por fumar mas não o será se abortar o seu filho.

O aborto é um flagelo a ser combatido. Há um ano atrás poderíamos acrescentar que até aqui estamos todos de acordo. Mas não é verdade: um primeiro balanço da aplicação da lei do aborto mostra-nos já, ainda a quente, que a banalização do aborto é o resultado da permissividade com que passámos a tratar a questão.

Portugal precisa de uma política de saúde consistente e coerente: identificar os males, combater as causas, fomentar as práticas que evitem o flagelo, seja através da prevenção, seja através do apoio às alternativas e, finalmente, proibir as práticas prejudiciais, respeitando os valores de liberdade em confronto.

Do tabagismo poderá recuperar-se o fumador, do aborto nunca mais se recuperarão pelo menos duas vítimas: a mãe e o seu filho. Ainda continuamos a tempo de o evitar.

Catarina Almeida , fumadora e ex-Mandatária do "Diz que Não"

In. http://da.online.pt/news.php?id=132472


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